Governar para as pessoas… mas espere um pouco. Para as pessoas ou para a cidade?

12 de setembro de 2024

Gosto muito da época das campanhas eleitorais para as prefeituras. Gosto da ideia de milhares de pessoas comuns se mobilizando e se oferecendo ao eleitor. É um misto de alegria, assombro, esperança e, a cada “rodada” (a cada 4 anos), risos, muitos risos.

São uma dúzia disputando a cadeira do prefeito e milhares disputando algumas dezenas de cadeiras dos vereadores municipais. Um funil brutal, onde alguns candidatos terminarão envergonhados sem contabilizar, sequer, os votos de seus próprios familiares.

Ainda assim – e com tudo isso, é a festa da democracia, talvez a única expressão real e verdadeiramente republicana, na qual os eleitos estejam ao alcance de seus eleitores (porque, convenhamos, não há vínculos menos importantes dos eleitos com seus eleitores do que num sistema de eleição proporcional, e onde a capital federal resta ilhada no planalto central).

Fosse o sistema do tipo distrital, a proximidade seria ainda maior, assim como a representatividade de cada candidato eleito com sua base de eleitores. Ainda que não seja o modelo ideal, um município nunca é grande o suficiente para que um vereador possa se esconder de seus malfeitos (eu disse malfeitos, mas a chance maior é de que sejam maus feitos).

Mas talvez o aspecto mais importante das campanhas eleitorais seja o foco da própria campanha: embora os cargos em disputa sejam para administrar e gerir uma cidade, quase ninguém ali se importa com a cidade propriamente dita, mas com as pessoas.

As campanhas eleitorais não são, ao final, para eleger os melhores administradores e os melhores programas para a cidade, mas, paradoxalmente, os candidatos mais generosos para as pessoas, os eleitores.

Ao invés de escolas municipais modernas, bem equipadas e cheias de professores competentes em cada bairro da cidade, subsídios no transporte público para que os pais e alunos possam se deslocar porcamente por uma hora ou duas até uma escola vergonhosamente obsoleta, pobre e distante.

Ao invés de qualidade, dignidade, “auxílio isso” e “bolsa aquilo”. Ao invés de moradias acessíveis e aluguel social nas zonas centrais, subsídios para habitações construídas a 2 horas de distância dos empregos. E tome subsídios para as empresas de ônibus transportarem, mal e porcamente, essas pessoas que foram morar a 2 horas das escolas e empregos.

E quase nada é dito sobre a cidade, suas necessidades, planos reais para soluções de problemas reais, visão de futuro e os mecanismos para alcançar esse futuro. A disputa por agentes públicos qualificados e competentes se transmutou, em algum momento da nossa história, num concurso de beleza, popularidade, influência e representatividade de minorias.

E quem elege beleza, popularidade, influência e representatividade de minorias ao invés de qualificação e competência, colhe problemas. “Quem planta vento, colhe tempestade” claro. Sempre.

Como formar cidadania e um sentimento de comunidade, compromisso e vínculo com o lugar e entre as pessoas, se o que está “em oferta” no balcão dos votos são benefícios pessoais? 

Não é possível, não é mesmo? Isso já não aconteceu na última eleição, e não vai acontecer nesta, eliminando qualquer chance de que consigamos forjar vínculos e senso de pertencimento, cidadania e uma percepção de comunidade e engajamento. 

Ideia maluca aqui: imagine se alguém, um candidato qualquer, fosse “disruptivo” a ponto de resgatar a velha e boa tradição republicana de criar uma visão de futuro para a cidade, um plano de governo que endereçasse os problemas históricos e propusesse vitalidade?

Qual seria o resultado?

*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.

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Arquiteto e Urbanista por 25 anos, Incorporador pelos últimos 5 anos (e contando). (lmyssior@gmail.com)
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