Em “Metrópole”, o inglês Ben Wilson entrelaça passado, presente e futuro para tecer a história daquelas que são consideradas a maior invenção da humanidade: as cidades.
Como contar a história das cidades partindo do passado, mas, sobretudo, mirando na construção de um futuro metropolitano?
Esse foi o desafio autoimposto por Ben Wilson em Metrópole: A história das cidades, a maior invenção humana, publicado internacionalmente em 2020 e há pouco no Brasil (Companhia das Letras; tradução de Odorico Leal; versões impressa e digital). Utilizando um conjunto de narrativas urbanas como principal recurso, Wilson tece uma linha do tempo – de 4000 a.C. a 2020 d.C. – fundada em extensa pesquisa e visitas a campo.
É verdade que diversos autores já propuseram suas versões para a história das cidades. Então, o que há de inovador na proposta de Wilson?
Um primeiro ponto é a apresentação da história de determinada cidade comparada a situações contemporâneas. Como resultado, os capítulos têm uma estrutura marcada entre passado e presente, intercalando localizações temporais e espaciais.
Outro elemento peculiar de Metrópole é a demonstração da efetiva adaptação das cidades. Foi assim que, segundo Wilson, elas conseguiram viver para além de suas primeiras populações. Do ponto de vista do autor, embora a estrutura edificada possa entrar em ruínas, isso não faz com que se perca a essência da cidade: “Uma cidade nunca é apenas uma coleção de construções: não é tanto sua fisicalidade que a diferencia de outros assentamentos, mas as atividades humanas que ela incuba”, afirma ele.
Lendo Metrópole, é impossível não conectar o livro ao placemaking e às dimensões de habitabilidade, uso, acessibilidade e sociabilidade. Embora não utilize tais categorias como instrumento declarado de análise, Wilson flagra os cidadãos de cada época, trazendo com precisão o seu cotidiano, inclusive indicando sensações de barulho ou odor nele presentes. A maneira como a distribuição da produção econômica impactou regiões longínquas umas das outras e a abordagem das desigualdades entre homens e mulheres, até mesmo no que diz respeito à sexualidade, são apenas alguns exemplos de como a obra vai além de uma visão purista de fatos, revelando aspectos de geografia, sociologia, arquitetura, arte, religião, etc.
Por fim, é preciso fazer uma ressalva: grandes cidades das Américas Central e do Sul – com exceção de Tenochtitlán – são mencionadas apenas em recortes comparativos. Isso, todavia, não reduz a potência de Metrópole, na medida em que, considerando o desafio que Wilson se propôs a enfrentar, o livro consegue ser bastante inovador, fazendo-nos lembrar do que escreveu Eric Hobsbawm (1917-2012), expressivo historiador do século XX: “A história não pode se esquivar do futuro”.
Heloisa Loureiro Escudeiro
Coordenadora-adjunta do Núcleo Arquitetura e Cidade do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.
Uma versão ampliada deste texto foi publicada na newsletter do Laboratório.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.