O adensamento urbano em Porto Alegre e a polêmica de um novo empreendimento
Apesar da repercussão negativa, é preciso entender como o empreendimento recém aprovado em Porto Alegre pode beneficiar a cidade.
Segundo o Censo 2022, as cidades médias (100 mil a 499 mil habitantes) ganharam 8,3 milhões de habitantes.
27 de julho de 2023A divulgação dos primeiros dados do Censo 2022 pegou muita gente de surpresa. Segundo o IBGE, o Brasil tem hoje cerca de 203 milhões de habitantes, número abaixo da expectativa do Instituto, que era de 215 milhões. Outro dado que chamou atenção foi o crescimento das cidades médias (100 mil a 499 mil habitantes), que ganharam 8,3 milhões de habitantes. Considerando que a população do país cresceu 12 milhões desde o Censo 2010, essas cidades respondem por mais de dois terços do aumento.
Antes de tudo, é preciso cuidado ao analisar esses dados. O Censo foi realizado em 2022, rompendo a periodicidade de 10 em 10 anos. Durante a pandemia, muitos optaram por sair das grandes cidades, enquanto o trabalho remoto levou muitas pessoas a regiões turísticas e litorâneas. Ainda não sabemos se essas tendências vão se reverter nos próximos anos. O Censo é um retrato de 2010 e 2022, mas dá pouca informação sobre como a população oscilou ano a ano.
O Censo 2022 revelou dinâmicas interessantes nas Regiões Metropolitanas. Esse mapa interativo produzido pelo G1 permite visualizar quais municípios ganharam ou perderam população.
Alguns municípios, como São Paulo e Curitiba, registraram crescimento baixo, de 1% a 2%, no intervalo de doze anos. A população dessas capitais está se estabilizando, mas as cidades ao seu redor cresceram bastante. É o caso de Cotia (36,04%), Barueri (31,45%), Osasco (11,5%) e Santo André (10,72%) em São Paulo. Já no entorno da capital paranaense, São José dos Pinhais (24,61%), Araucária (27,32%) e Fazenda Rio Grande (82,27%) mostram a mesma tendência.
Belo Horizonte (-2,53%), Fortaleza (-1,26%) e Natal (-6,52%) são municípios que estão perdendo população, mas as suas RMs estão aumentando. Podemos destacar o crescimento de Nova Lima-MG (37,9%), Caucaia-CE (11,28%) e Parnamirim-RN (24,83%). Junto com São Paulo e Curitiba, essas são RMs onde os municípios centrais estão ficando menos atraentes, ao passo que a região como um todo cresce.
É possível que a migração para o entorno esteja sendo estimulada pelo alto custo de moradia nos municípios centrais, pela adoção do trabalho remoto, e pela percepção de que a violência urbana e qualidade de vida nas grandes metrópoles estão piorando.
Em outras capitais, como Porto Alegre (-5,45%) e Rio de Janeiro (-1,72%), tanto os municípios centrais quanto a RM estão perdendo população, o que é um sinal de declínio ainda mais preocupante. No caso do Rio, a exceção é Maricá (54,87%), que cresceu bastante enquanto os outros municípios da RM estagnaram ou perderam população.
Na região Sul, municípios da Serra Gaúcha como Bento Gonçalves (17,67%) e Caxias do Sul (6,38%) estão crescendo, o que indica que a população de Porto Alegre pode estar migrando para essa região. Essa migração também pode estar colaborando para o crescimento de Florianópolis (27,53%), cuja RM inclui os municípios de Palhoça (62,09%) e São José (28,83%).
Há ainda as capitais que estão crescendo junto com suas RMs. Encontramos essa tendência nas capitais do Centro-Oeste (Brasília, 9,52%, Goiânia, 10,39%, Cuiabá, 17,66% e Campo Grande, 14,13%) e em algumas cidades do Nordeste, como Teresina (6,39%) e João Pessoa (15,26%). O crescimento dessas cidades mostra a sua capacidade de atrair migrantes de outros lugares.
O Censo 2022 mostra como o agronegócio tem impulsionado o crescimento das cidades médias. No Mato Grosso, Rondonópolis (25,21%) continua aumentando, enquanto Sorriso (66,30%) e Sinop (73,36%) estão entre as que mais crescem no Brasil. Acompanhando o avanço da fronteira agrícola do Centro-Oeste em direção ao Norte, é interessante notar o crescimento das capitais Rio Branco (8,55%) e Porto Velho (7,44%).
Já no Matopiba, sigla para Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia, a produção agrícola tem aberto novas fronteiras no interior dos estados. Cabe destacar o crescimento de Barreiras-BA (16,24%), Luís Eduardo Magalhães-BA (79,50%), Palmas-TO (32,57%), Balsas-MA (21,66%) e Imperatriz-MA (10,35%). Em Goiás, centros regionais como Formosa(15,57%) e Rio Verde (27,93%) também ganharam população.
O Censo 2022 também mostra que algumas cidades médias, por estarem distantes das capitais, acabam assumindo o papel de centro regional. Em geral, o crescimento desses municípios puxa o das cidades ao seu redor. Isso tem acontecido em Uberlândia (18,08%), Joinville (19,61%) e na região Londrina-Maringá (9,77% e 15,26%, respectivamente). Essas cidades estão perto ou já ultrapassaram os 500 mil habitantes, agrupando uma variedade de comércio e serviços comparável à das capitais.
A lição do Censo 2022 é que o Brasil caminha para estabilizar sua população. A taxa de crescimento anual, de 0,52%, é a menor já registrada pelo IBGE. Isso significa um Brasil com mais idosos e uma força de trabalho menor. Desde a divulgação dos resultados, não faltaram alertas sobre o desafio de manter o crescimento econômico em um país que envelhece rapidamente e não tem conseguido distribuir sua riqueza.
Menos óbvio é o cenário de competição que vem se formando. A capacidade de atrair migrantes, e principalmente jovens, passou a ser vital para que as cidades evitem o declínio.
As grandes capitais saem em desvantagem, pois contam com vastas áreas urbanizadas e uma rede de infraestrutura que exige investimento para continuar funcionando. O padrão de crescimento urbano espraiado, repleto de assentamentos informais e favelas, é outro problema que custará caro para ser resolvido. A perda de população traz consigo a perda de arrecadação tributária, o que torna ainda mais difícil balancear essa equação.
Do lado das cidades médias, sobram oportunidades. Esses municípios têm a chance de expandir sua malha urbana através de grelhas viárias, demarcando previamente as ruas e reservando espaço para o lazer e a infraestrutura urbana. Também podem adotar regulações de uso do solo que produzam bairros de uso misto, densos e caminháveis, com potencial construtivo adequado para conter o espraiamento.
Nessa disputa, as capitais têm bons motivos para se assustar.
Somos um projeto sem fins lucrativos com o objetivo de trazer o debate qualificado sobre urbanismo e cidades para um público abrangente. Assim, acreditamos que todo conteúdo que produzimos deve ser gratuito e acessível para todos.
Em um momento de crise para publicações que priorizam a qualidade da informação, contamos com a sua ajuda para continuar produzindo conteúdos independentes, livres de vieses políticos ou interesses comerciais.
Gosta do nosso trabalho? Seja um apoiador do Caos Planejado e nos ajude a levar este debate a um número ainda maior de pessoas e a promover cidades mais acessíveis, humanas, diversas e dinâmicas.
Quero apoiarApesar da repercussão negativa, é preciso entender como o empreendimento recém aprovado em Porto Alegre pode beneficiar a cidade.
Confira nossa conversa com Alexandre Cardeman, responsável pela implantação do Centro de Operações do Rio de Janeiro.
Na gestão urbana, é imprescindível entender as implicações econômicas da regulação do uso do solo e como elas afetam a vida de milhares de pessoas.
Os caminhos para melhorar custo, governança e qualidade nas políticas de mobilidade urbana, tanto em municípios maiores quanto nos menores, via integração de diferentes meios de transporte públicos e privados.
Existem alguns equívocos comuns nas escolhas que vêm sendo feitas em políticas de mobilidade urbana, especialmente em relação à eletrificação da frota e à adoção da tarifa zero.
A métrica de "custo de construção por passageiro" é utilizada para avaliar o custo-benefício de sistemas de transporte em relação ao número de passageiros atendidos, mas ela deve ser analisada com cautela.
Confira nossa conversa com a engenheira florestal Isabela Guardia sobre arborização urbana.
Na perspectiva do desenvolvimento econômico, vemos que alguns aspectos da configuração urbana de São Paulo são excludentes.
Banheiros públicos são investimentos essenciais para garantir a qualidade dos espaços públicos nas cidades.
COMENTÁRIOS