Repensando a segurança pública – o potencial das cidades inteligentes
8 de agosto de 2024Não, definitivamente não é mais a saúde a preocupação número 1 dos paulistanos. Pela segunda vez consecutiva, uma pesquisa do Datafolha revelou que a segurança ocupa tal posição. O levantamento, divulgado no último mês de março, repetiu o que já havia sido apurado em agosto de 2023, quando, após 11 anos, os paulistanos sinalizaram que a saúde tinha deixado de ser considerada o principal problema da cidade, perdendo o posto para a segurança. Ainda que não seja responsabilidade constitucional exclusiva do município, o tema da segurança – ou ainda, da “insegurança” – já está, obviamente, no radar das campanhas dos candidatos a prefeito.
Dito dessa maneira, dá a impressão de que a segurança pública seja uma questão que possa ser tratada isoladamente. Nada mais enganoso. Segurança tem a ver com moradia, iluminação pública, educação, mobilidade – tudo aquilo que é o antônimo de desigualdade social. Quando faltam políticas públicas bem planejadas e implementadas, a população perde cidadania, perde o seu direito à cidade. Não por acaso, a ideia de que se possa resolver a questão da segurança apenas com o aumento – e a truculência – do aparato policial tem se mostrado um vergonhoso fracasso. Nesse sentido, é importante considerar as palavras de Ricardo Balestreri, coordenador do Núcleo de Urbanismo Social e Segurança Pública do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper: “Não se faz segurança pública só com polícia”.
Tampouco sem o uso de dados certos. É aí que o conceito de cidade inteligente pode ser decisivo no enfrentamento do problema que mais atormenta os paulistanos. Cidades inteligentes são aquelas que utilizam tecnologia e dados para o planejamento urbano e a tomada de decisões com o propósito de oferecer melhor qualidade de vida para os seus habitantes – incluindo a despreocupação com a segurança.
São incontáveis os benefícios do uso adequado de dados nessa frente. A utilização, por exemplo, de sensores inteligentes para coletar e analisar dados sobre padrões de criminalidade pode resultar em uma alocação mais eficiente de recursos. Processados por algoritmos avançados, tais dados conseguem identificar tendências capazes de indicar áreas de maior risco para crimes, permitindo antecipá-los com maior eficácia do que apertando gatilhos.
Uma cidade inteligente utiliza a tecnologia para integrar e analisar informações, inclusive intersetoriais, com a finalidade de, sublinhemos, permitir que gestores públicos tomem as melhores decisões baseadas em dados, evidências – e fatos. Essa integração permite que diferentes setores e órgãos governamentais “conversem” entre si – como foi dito antes, segurança não é atribuição exclusiva do município, razão pela qual é imprescindível que as autoridades dos âmbitos estadual e federal atuem junto com ele no combate à violência – por meio de sistemas de informação interligados, plataformas digitais e e-participation (isso é, participação cidadã facilitada por meios eletrônicos e digitais). Tal estratégia permite uma resposta mais coordenada e eficiente diante de emergências e crises de segurança.
Cidades inteligentes podem ajudar nos três níveis de gestão (estratégica, tática e operacional). Todavia, para serem realmente efetivas, precisam estar alinhadas com outras políticas públicas, sob o olhar intersetorial de que se falou antes. Não há inteligência, muito menos segurança, em uma cidade que se veja dividida em compartimentos incomunicáveis e se ponha de costas para os dados que ela mesma produz, segundo a segundo – incessantemente.
Donizete Beck
Pesquisador de pós-doutorado no Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.
Mauricio Bouskela
Coordenador do Núcleo Economia Urbana, Cidades Inteligentes e Big Data do Laboratório Arq.Futuro de Cidades do Insper.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Caos Planejado.